Estrutura e Organização da Pelve e do Períneo
Definições e Conceitos Fundamentais da Região Pélvica
Diferenciação entre Pelve e Quadril
A terminologia anatômica distingue claramente os conceitos de pelve e quadril. O termo quadril refere-se especificamente à articulação coxofemoral, a articulação sinovial do tipo esferoide formada pela cabeça do fêmur e o acetábulo do osso do quadril. Esta articulação é responsável por uma vasta gama de movimentos. Em contrapartida, a pelve, também denominada bacia, designa o conjunto de estruturas ósseas que formam a porção póstero-inferior do tronco. A compreensão dessa distinção é fundamental para o estudo da anatomia e da biomecânica do esqueleto apendicular inferior e sua conexão com o esqueleto axial.
Componentes Ósseos da Pelve
A estrutura óssea da pelve é composta pelos ossos do quadril direito e esquerdo, que se articulam anteriormente na sínfise púbica, e pelo sacro, com o qual se articulam posteriormente através das articulações sacroilíacas. Cada osso do quadril é, por sua vez, o resultado da fusão de três ossos: o ílio, o ísquio e o púbis. O termo "osso ilíaco" é por vezes utilizado, mas a denominação "osso do quadril" é mais precisa, pois engloba os três componentes ósseos. A pelve óssea, portanto, constitui uma estrutura anelar robusta que une o tronco aos membros inferiores e protege as vísceras pélvicas.
Divisão da Pelve: Pelve Maior e Pelve Menor
A pelve é anatomicamente dividida em duas regiões por um plano oblíquo que define a abertura pélvica superior. A região acima desta abertura é denominada pelve maior ou pelve falsa, e é delimitada lateralmente pelas asas dos ílios. A região abaixo da abertura pélvica superior é a pelve menor ou pelve verdadeira, que contém a cavidade pélvica e as vísceras nela alojadas. Esta distinção possui relevância clínica, especialmente em obstetrícia, onde o "encaixe" da cabeça fetal ocorre na pelve menor, indicando o início do trabalho de parto.
Curvaturas da Coluna Vertebral e Inclinação Pélvica
A orientação da pelve no corpo humano é influenciada pelas curvaturas fisiológicas da coluna vertebral. As curvaturas primárias, presentes ao nascimento, são as cifoses (torácica e sacral), com concavidade anterior. As curvaturas secundárias, as lordoses (cervical e lombar), desenvolvem-se com o progresso do desenvolvimento motor craniocaudal. A lordose cervical forma-se com a sustentação da cabeça, e a lordose lombar, com a aquisição da postura ereta e da marcha. A combinação da lordose lombar com a cifose sacral resulta em uma inclinação anterior da pelve, fazendo com que a sua posição não seja um alinhamento vertical contínuo com o abdome, mas sim uma orientação póstero-inferior. Variações na magnitude dessas curvaturas podem existir, inclusive relacionadas a fatores étnicos, como a tendência a uma coluna mais retificada em populações asiáticas.
Diferenças Sexuais na Pelve Óssea
Existem diferenças morfológicas significativas entre a pelve masculina e a feminina, adaptadas principalmente às funções reprodutivas. As principais distinções são:
Asas do Ílio: Na pelve feminina, as asas do ílio são mais alargadas e evertidas, enquanto na masculina são mais alongadas e verticais.
Ângulo Subpúbico: O ângulo formado pelos ramos isquiopúbicos inferiores é maior na mulher, aproximando-se ou excedendo 90 graus, enquanto no homem é mais agudo e fechado.
Abertura da Pelve Verdadeira: A abertura pélvica superior na mulher tende a ser mais ovalada e espaçosa. No homem, é tipicamente mais estreita e com formato triangular ou de coração.
O Cíngulo do Membro Inferior
O cíngulo do membro inferior, anteriormente conhecido como cintura pélvica, é a estrutura que conecta o esqueleto apendicular (membro inferior) ao esqueleto axial (tronco). É formado pelos ossos do quadril, que se articulam com o sacro. De forma análoga, o cíngulo do membro superior (cintura escapular) é composto pela clavícula e pela escápula, unindo o membro superior ao tronco.
Cavidades do Tronco e Limites Pélvicos
A Cavidade Abdominopélvica
O tronco humano contém uma grande cavidade que se estende da base do pescoço até a região pélvica. Esta cavidade é subdividida pelo músculo diafragma em uma cavidade torácica superior e uma cavidade abdominopélvica inferior. A cavidade abdominopélvica, por sua vez, é um espaço contínuo que abriga os órgãos abdominais e pélvicos. Embora não haja uma separação física clara, a porção superior é denominada cavidade abdominal e a porção inferior, contida na pelve menor, é a cavidade pélvica. O limite inferior da cavidade abdominopélvica é formado por uma estrutura muscular denominada diafragma da pelve ou assoalho pélvico.
Conteúdo da Cavidade Pélvica
A cavidade pélvica abriga diversas vísceras dos sistemas urinário, digestivo e reprodutor. Entre os órgãos pélvicos encontram-se a bexiga urinária, a próstata (no homem), os ovários e o útero (na mulher), e as porções terminais do trato gastrointestinal, como o reto e o cólon sigmoide. Algumas estruturas, como o jejuno e o íleo, são consideradas órgãos abdominopélvicos, pois ocupam tanto a cavidade abdominal quanto a pélvica. A bexiga urinária, quando vazia, é um órgão pélvico; no entanto, ao se encher, expande-se superiormente para a cavidade abdominal.
O Assoalho Pélvico (Diafragma da Pelve)
O assoalho pélvico, ou diafragma da pelve, é um complexo muscular em forma de funil ou tigela que constitui o limite inferior da cavidade pélvica, separando-a do períneo. Esta estrutura desempenha funções cruciais, incluindo a sustentação das vísceras abdominopélvicas e a manutenção da continência urinária e fecal através de uma contração tônica constante. O enfraquecimento desta musculatura pode levar a condições como incontinência e prolapso de órgãos pélvicos. Sendo composta por musculatura esquelética, é passível de fortalecimento através de fisioterapia pélvica, que pode ser indicada tanto preventivamente, como durante a gestação, quanto para tratamento de disfunções já instaladas.
Músculos do Diafragma da Pelve
O diafragma da pelve é constituído por um par de músculos principais de cada lado: o músculo levantador do ânus e o músculo isquiococcígeo (ou coccígeo). Juntos, esses músculos e suas fáscias associadas formam uma estrutura de suporte dinâmico. É importante notar que, embora o músculo isquiococcígeo componha o diafragma pélvico, ele não faz parte do complexo muscular do levantador do ânus.
Componentes do Músculo Levantador do Ânus
O músculo levantador do ânus é um músculo amplo e complexo, formado por três componentes principais. De anterior para posterior, são eles:
Músculo Puborretal: Origina-se no púbis e forma uma alça ao redor da junção anorretal, sendo crucial para a continência fecal.
Músculo Pubococcígeo: Origina-se no púbis e se insere no cóccix e no ligamento anococcígeo.
Músculo Iliococcígeo: A porção mais posterior, origina-se no arco tendíneo do músculo levantador do ânus e se insere no cóccix.
O Hiato Urogenital
Anteriormente, entre as bordas mediais dos músculos levantadores do ânus, existe uma abertura denominada hiato urogenital. Esta passagem permite a travessia de estruturas do sistema urinário e genital. No homem, o hiato permite a passagem da uretra. Na mulher, permite a passagem tanto da uretra quanto da vagina.
Relações Peritoneais na Cavidade Pélvica
Reflexões Peritoneais e Escavações
O peritônio, a membrana serosa que reveste a cavidade abdominal, estende-se inferiormente para a cavidade pélvica, cobrindo a superfície superior de algumas vísceras pélvicas. Ao passar de um órgão para outro, o peritônio forma dobras e recessos conhecidos como escavações ou fundos-de-saco. Essas escavações são os pontos mais inferiores da cavidade peritoneal e podem acumular fluidos em processos patológicos.
Escavações Pélvicas no Sexo Masculino
No homem, o peritônio reflete-se da superfície superior da bexiga para a face anterior do reto, formando uma única escavação, a escavação retovesical.
Escavações Pélvicas no Sexo Feminino
Na mulher, a presença do útero entre a bexiga e o reto resulta na formação de duas escavações. Anteriormente, o peritônio reflete-se da bexiga para o útero, formando a escavação vesicouterina. Posteriormente, reflete-se do útero para o reto, formando a escavação retouterina (também conhecida como fundo-de-saco de Douglas).
Pregas Peritoneais
Além das escavações, o peritônio forma pregas ao recobrir estruturas subjacentes, como vasos sanguíneos e ligamentos remanescentes do desenvolvimento fetal. Um exemplo é a prega formada sobre o ligamento umbilical mediano (um remanescente do úraco), que se projeta na parede abdominal anterior.
Vascularização e Drenagem da Pelve
Artérias Principais da Pelve
A vascularização arterial da pelve menor difere entre os sexos quanto ao número de artérias principais que nela adentram. Na mulher, são seis artérias principais: as artérias ilíacas internas (par), as artérias ováricas (par, ramos da aorta abdominal), a artéria sacral mediana (ramo da aorta) e a artéria retal superior (ramo terminal da artéria mesentérica inferior). No homem, são quatro artérias principais, pois as artérias testiculares (homólogas das ováricas) não entram na cavidade pélvica, passando diretamente pelo canal inguinal para irrigar os testículos no escroto.
Artéria Ilíaca Interna e suas Divisões
A artéria ilíaca interna é a principal fonte de irrigação para as vísceras pélvicas, o assoalho pélvico, o períneo e a região glútea. Originada da bifurcação da artéria ilíaca comum (em L4-L5), ela descende para a pelve menor e se divide em um tronco anterior e um tronco posterior, cada um dando origem a múltiplos ramos.
Divisão Anterior da Artéria Ilíaca Interna
O tronco anterior da artéria ilíaca interna irriga predominantemente as vísceras pélvicas. Seus ramos incluem a artéria umbilical (cuja porção distal se oblitera), a artéria obturatória, a artéria vesical inferior, a artéria retal média, a artéria pudenda interna (principal artéria do períneo), a artéria glútea inferior, e, na mulher, as artérias uterina e vaginal.
Divisão Posterior da Artéria Ilíaca Interna
O tronco posterior da artéria ilíaca interna supre principalmente a parede pélvica e a região glútea. Seus ramos são a artéria iliolombar, as artérias sacrais laterais e a artéria glútea superior. As artérias glúteas superior e inferior passam através do forame isquiático maior para irrigar os músculos da região glútea.
Drenagem Venosa da Pelve
A drenagem venosa da pelve é realizada por uma rede de veias interconectadas que formam plexos venosos pélvicos. Esses plexos recebem nomes de acordo com os órgãos que drenam, como os plexos retal, vesical, prostático, uterino e vaginal. A maior parte do sangue desses plexos drena para a veia ilíaca interna. A veia ilíaca interna une-se à veia ilíaca externa para formar a veia ilíaca comum, que, por sua vez, contribui para a formação da veia cava inferior.
Anatomia do Períneo
Definição e Limites do Períneo
O períneo é a região superficial do tronco, localizada inferiormente ao diafragma da pelve. Possui um formato de losango, cujos vértices são definidos por pontos de referência ósseos: a sínfise púbica (anteriormente), a ponta do cóccix (posteriormente) e as tuberosidades isquiáticas (lateralmente). Esta área contém as aberturas terminais dos tratos urinário e digestivo, bem como os órgãos genitais externos.
Divisão do Períneo: Trígono Urogenital e Trígono Anal
Uma linha imaginária traçada entre as duas tuberosidades isquiáticas divide o períneo em duas áreas triangulares. O triângulo anterior é o trígono urogenital, que contém as estruturas da genitália externa e a abertura da uretra. O triângulo posterior é o trígono anal, que contém o canal anal e seu orifício, o ânus, circundado pelo esfíncter externo do ânus.
Músculos do Períneo
O períneo contém um conjunto de músculos superficiais e profundos que estão associados às estruturas genitais e anais. Os principais músculos do períneo incluem:
Músculo Bulboesponjoso
Músculo Isquiocavernoso
Músculo Transverso Superficial do Períneo
Músculo Transverso Profundo do Períneo
Músculo Esfíncter Externo do Ânus
O Corpo do Períneo (Ponto Central do Períneo)
O corpo do períneo, também conhecido como ponto central do períneo, é uma massa fibromuscular localizada na linha média, entre os trígonos urogenital e anal. É um ponto de convergência e entrelaçamento de fibras de vários músculos perineais, incluindo o bulboesponjoso, o esfíncter externo do ânus e os músculos transversos superficial e profundo do períneo. O músculo isquiocavernoso, por sua localização mais lateral, não contribui para a formação do corpo do períneo. Esta estrutura confere resistência e integridade ao assoalho pélvico.
Considerações Clínicas
A anatomia do períneo tem implicações clínicas importantes, especialmente no parto. A episiotomia é um procedimento cirúrgico que consiste em uma incisão no períneo para ampliar a abertura vaginal e facilitar o parto, prevenindo lacerações descontroladas. A incisão é geralmente realizada em direção posterolateral para evitar danos ao corpo do períneo e ao esfíncter anal. Outra condição clínica relevante é a Bartholinite, uma inflamação das glândulas vestibulares maiores (glândulas de Bartholin), localizadas no trígono urogenital feminino.

