O Traumatismo Cranioencefálico (TCE) é definido como qualquer agressão de origem externa que acarreta lesão anatômica ou comprometimento funcional do crânio, do encéfalo ou de seus envoltórios (meninges). Representa uma das principais causas de mortalidade e incapacidade permanente em todo o mundo, constituindo um grave problema de saúde pública no Brasil.
A gravidade do TCE é classicamente estratificada com base na Escala de Coma de Glasgow (ECG), avaliada após a reanimação inicial e na ausência de fatores de confusão (ex: sedação, álcool, drogas). A pontuação varia de 3 a 15, sendo classificada da seguinte forma:
TCE Leve: ECG 13-15
TCE Moderado: ECG 9-12
TCE Grave: ECG ≤ 8 (indicação formal de via aérea definitiva)
As causas mais comuns de TCE no cenário brasileiro refletem um padrão global, com predomínio de:
Acidentes de trânsito: Especialmente envolvendo motociclistas e pedestres.
Quedas: Principal causa em extremos de idade (crianças e, principalmente, idosos).
Violência interpessoal: Agressões físicas e ferimentos por projétil de arma de fogo.
A epidemiologia do TCE exibe uma distribuição etária bimodal. O primeiro pico ocorre em adultos jovens (15-30 anos), predominantemente do sexo masculino, associado a comportamentos de risco. O segundo pico ocorre em idosos (>65 anos), principalmente devido a quedas, e frequentemente associado a maior morbimortalidade devido a comorbidades e uso de anticoagulantes/antiagregantes.
Pérola Clínica: O conceito de "hora de ouro" (golden hour) é fundamental no atendimento ao TCE. Refere-se à primeira hora após o trauma, período no qual a instituição de medidas de suporte à vida e a prevenção de lesões secundárias têm o maior impacto na redução da mortalidade e na melhoria do prognóstico neurológico. A agilidade e a eficácia do atendimento pré-hospitalar e da sala de emergência são decisivas.
A compreensão da patofisiologia do TCE é crucial para o manejo clínico, pois o tratamento visa mitigar os danos que ocorrem após o evento inicial. A lesão cerebral é dividida em duas fases distintas: primária e secundária.
Lesão Cerebral Primária
A lesão primária ocorre no exato momento do impacto e é resultado direto das forças mecânicas aplicadas ao crânio e ao encéfalo. Este dano é, em grande parte, irreversível e completo no momento em que o paciente chega ao hospital. O objetivo do tratamento não é reverter a lesão primária, mas sim identificar sua extensão e prevenir a progressão do dano. Exemplos incluem:
Fraturas cranianas: Lineares, com afundamento, de base de crânio.
Contusões e Lacerações Cerebrais: Lesões focais do parênquima cerebral, frequentemente em áreas de "golpe" e "contragolpe".
Lesão Axonal Difusa (LAD): Resultante de forças de cisalhamento e rotação que causam estiramento e ruptura de axônios na substância branca. É uma causa comum de coma e déficits neurológicos graves em pacientes com tomografia de crânio aparentemente normal ou com poucas alterações.
Hematomas intracranianos: Epidural, subdural, intraparenquimatoso.
Lesão Cerebral Secundária
A lesão secundária não ocorre no momento do trauma, mas se desenvolve nas horas e dias seguintes. Consiste em uma complexa cascata de eventos moleculares, inflamatórios e metabólicos que são desencadeados pela lesão primária. Ao contrário da lesão primária, a lesão secundária é potencialmente evitável ou tratável. O principal objetivo do manejo inicial do TCE é a prevenção e o tratamento desses insultos secundários. Os principais mecanismos incluem:
Hipotensão Arterial (PAS < 100 mmHg): Reduz a pressão de perfusão cerebral (PPC), levando à isquemia.
Hipóxia (SpO₂ < 94%): Priva o cérebro lesionado, que já possui um metabolismo aumentado, do oxigênio necessário, exacerbando o dano celular.
Edema Cerebral: Pode ser citotóxico (acúmulo de água intracelular) ou vasogênico (quebra da barreira hematoencefálica), levando ao aumento do volume cerebral.
Aumento da Pressão Intracraniana (PIC): Consequência do edema, hematomas ou hidrocefalia. A PIC elevada comprime o tecido cerebral, reduz a PPC e pode levar a herniações cerebrais fatais.
Excitotoxicidade: Liberação maciça de neurotransmissores excitatórios (como glutamato), que leva a um influxo de cálcio nas células e ativa vias de morte celular.
Eventos inflamatórios e estresse oxidativo: Contribuem para a disfunção da barreira hematoencefálica e apoptose neuronal.
Pérola Clínica: A mensagem central da patofisiologia do TCE é clara: o foco do tratamento inicial é combater a lesão secundária. Cada episódio de hipotensão ou hipóxia pode devastar um cérebro já vulnerável. A vigilância e a correção agressiva desses parâmetros são a pedra angular do manejo do TCE grave.
A abordagem inicial ao paciente com TCE segue rigorosamente o protocolo ATLS® (Advanced Trauma Life Support), priorizando a avaliação e o manejo sistemático de lesões que ameaçam a vida. A sequência ABCDE garante que as condições mais letais sejam tratadas primeiro.
A: Airway (Vias Aéreas com Proteção da Coluna Cervical)
A manutenção de uma via aérea pérvia é a prioridade máxima. Em um paciente com TCE, especialmente com rebaixamento do nível de consciência (ECG ≤ 8), a via aérea está em risco de obstrução pela língua, sangue ou vômito.
Avaliação: Verificar se o paciente está falando, observar a presença de corpos estranhos, secreções ou estridor.
Manejo:
Manobras manuais como chin lift (elevação do queixo) ou jaw thrust (projeção da mandíbula) são a primeira linha. A manobra de jaw thrust é preferível, pois minimiza a movimentação da coluna cervical.
Aspiração de secreções e uso de cânulas orofaríngea ou nasofaríngea em pacientes sem reflexo de vômito.
Via Aérea Definitiva: A intubação orotraqueal está indicada em pacientes com ECG ≤ 8, incapacidade de proteger a via aérea, ou insuficiência respiratória. Deve ser realizada com técnica de sequência rápida e estabilização manual da coluna cervical.
Proteção da Coluna Cervical: Todo paciente com TCE é considerado portador de lesão de coluna cervical até que se prove o contrário. A imobilização com colar cervical e prancha rígida deve ser mantida durante todo o atendimento inicial.
B: Breathing (Respiração e Ventilação)
Garantir que o paciente esteja ventilando adequadamente e recebendo oxigênio é crucial para prevenir a hipóxia cerebral.
Avaliação: Expor o tórax, avaliar a frequência respiratória, a simetria da expansão torácica, realizar ausculta pulmonar e oximetria de pulso.
Manejo: Administrar oxigênio suplementar a todos os pacientes com TCE para manter a saturação de oxigênio (SpO₂) > 94%. Ventilar com bolsa-válvula-máscara se necessário. Identificar e tratar imediatamente lesões torácicas que ameaçam a vida (ex: pneumotórax hipertensivo).
C: Circulation (Circulação com Controle de Hemorragia)
A hipotensão é um dos piores inimigos do cérebro traumatizado, pois reduz drasticamente a pressão de perfusão cerebral.
Avaliação: Verificar pulso, pressão arterial, perfusão periférica (tempo de enchimento capilar), e procurar por fontes de sangramento externo.
Manejo:
Controlar qualquer hemorragia externa visível com compressão direta.
Obter dois acessos venosos periféricos de grosso calibre (ex: 14G ou 16G).
Iniciar reposição volêmica com cristaloides aquecidos (Ringer Lactato ou Soro Fisiológico 0,9%). O objetivo é manter a pressão arterial sistólica (PAS) ≥ 100 mmHg em adultos.
Pérola Clínica: Em um paciente com TCE isolado, a hipotensão raramente é causada pela lesão cerebral em si (a exceção é o estágio terminal com falência do tronco encefálico). Sempre presuma que a hipotensão em um paciente traumatizado se deve a choque hemorrágico por outra lesão (tórax, abdome, pelve, membros) até que se prove o contrário.
D: Disability (Incapacidade, Avaliação Neurológica)
Uma avaliação neurológica rápida e padronizada é realizada para determinar a gravidade da lesão cerebral e detectar sinais de lateralização.
Escala de Coma de Glasgow (ECG): Avalia a melhor resposta ocular, verbal e motora. É fundamental para a classificação da gravidade do TCE e para monitorar a evolução do paciente.
Avaliação Pupilar: Observar o tamanho, simetria e reatividade à luz. Uma pupila dilatada e não reativa (midríase paralítica) pode indicar compressão do nervo oculomotor (III par craniano) devido a uma herniação uncal, uma emergência neurocirúrgica.
E: Exposure (Exposição e Controle do Ambiente)
O paciente deve ser completamente despido para permitir um exame completo da cabeça aos pés, a fim de não omitir lesões associadas.
Manejo: Após a exposição completa, o paciente deve ser coberto com mantas aquecidas para prevenir a hipotermia. A hipotermia pode exacerbar a coagulopatia, a acidose e piorar o prognóstico neurológico.
A avaliação secundária só deve ser iniciada após a conclusão da avaliação primária (ABCDE), a estabilização das funções vitais e a reanimação inicial. Esta etapa consiste em um exame detalhado da cabeça aos pés e na coleta de uma história clínica mais completa para identificar todas as lesões.
História Clínica (AMPLE)
Quando possível, a história do trauma deve ser obtida com o paciente, familiares, testemunhas ou equipe de atendimento pré-hospitalar. O mnemônico AMPLE é uma ferramenta útil para coletar informações essenciais:
A - Alergias (especialmente a medicamentos).
M - Medicamentos em uso (particularmente anticoagulantes, antiagregantes plaquetários, ou anti-hipertensivos).
P - Passado médico / Prenhez (comorbidades como hipertensão, diabetes, cardiopatias; estado de gravidez).
L - Líquidos e última refeição (importante para planejamento de cirurgias de emergência).
E - Eventos relacionados ao trauma (mecanismo do trauma, tempo decorrido, perda de consciência, amnésia, convulsões).
Exame Físico da Cabeça aos Pés
Um exame sistemático é realizado para identificar lesões que não foram aparentes na avaliação primária.
Cabeça e Face: Inspecionar e palpar o couro cabeludo em busca de lacerações, hematomas e fraturas com afundamento. Avaliar a face em busca de assimetrias, fraturas e lesões oculares.
Exame Neurológico Focado:
Reavaliação da Escala de Coma de Glasgow (ECG): A ECG deve ser reavaliada frequentemente para detectar deterioração neurológica. Uma queda de 2 ou mais pontos na ECG é um sinal de alarme.
Pesquisa de Sinais de Fratura de Base de Crânio: Estes sinais indicam uma lesão de alta energia e podem não ser visíveis na tomografia. Sua presença exige alta suspeição clínica.
Sinal de Battle: Equimose retroauricular (sobre o processo mastoide).
Olhos de Guaxinim (Raccoon Eyes): Equimose periorbitária bilateral.
Hemotímpano: Sangue visível atrás da membrana timpânica na otoscopia.
Fístula Liquórica: Saída de líquido cefalorraquidiano (LCR) pelo nariz (rinorreia) ou ouvido (otorreia).
Avaliação Motora e Sensitiva: Pesquisar déficits focais, assimetrias de força ou sensibilidade que possam indicar uma lesão localizada.
Pescoço, Tórax, Abdome, Pelve e Membros: Exame completo de todos os segmentos corporais em busca de outras lesões traumáticas.
Pérola Clínica: Para diferenciar a rinorreia liquórica de uma coriza comum à beira do leito, pode-se realizar o "teste do halo" ou "sinal do duplo anel". Coloque uma gota do fluido em um papel filtro ou lenço de papel. Se for LCR, o sangue se concentrará no centro e um anel mais claro de LCR se formará ao redor (o halo), devido à cromatografia diferencial.
A neuroimagem é um pilar no diagnóstico e manejo do TCE, sendo a Tomografia Computadorizada (TC) de crânio o exame de escolha na fase aguda.
Tomografia Computadorizada (TC) de Crânio sem Contraste
A TC de crânio sem contraste é o padrão-ouro para a avaliação inicial do paciente com TCE. É um exame rápido, amplamente disponível e excelente para identificar lesões que requerem intervenção neurocirúrgica de urgência.
Indicações: A TC está indicada em todos os casos de TCE moderado (ECG 9-12) e grave (ECG ≤ 8). Para o TCE leve (ECG 13-15), a indicação é mais seletiva.
Vantagens: Rápida aquisição de imagens, alta sensibilidade para hemorragias agudas, fraturas ósseas, edema e efeito de massa.
Critérios de Decisão Clínica para TC em TCE Leve
Para evitar a exposição desnecessária à radiação em pacientes de baixo risco com TCE leve, foram desenvolvidas regras de decisão clínica. As mais utilizadas são a Canadian CT Head Rule (CCHR) e os critérios NEXUS II. A CCHR é frequentemente preferida por sua maior especificidade.
Canadian CT Head Rule (para pacientes com TCE leve, ECG 13-15, com perda de consciência, amnésia ou desorientação):
Fatores de Alto Risco (para intervenção neurocirúrgica):
ECG < 15 duas horas após o trauma.
Suspeita de fratura de crânio aberta ou com afundamento.
Qualquer sinal de fratura de base de crânio.
Vômitos (≥ 2 episódios).
Idade ≥ 65 anos.
Fatores de Médio Risco (para lesão cerebral na TC):
Amnésia antes do impacto > 30 minutos.
Mecanismo de trauma perigoso (ex: queda de altura > 1 metro ou 5 degraus, atropelamento, ejeção de veículo).
Se qualquer um desses fatores estiver presente, a TC de crânio é recomendada.
Principais Achados na TC de Crânio
O médico emergencista deve ser capaz de reconhecer os seguintes achados críticos:
Hematoma Epidural (Extradural): Coleção de sangue entre a dura-máter e a tábua óssea interna. Classicamente tem formato biconvexo ou lenticular. Frequentemente associado a fratura de osso temporal e lesão da artéria meníngea média.
Hematoma Subdural: Coleção de sangue entre a dura-máter e a aracnoide, resultante da ruptura de veias ponte. Tem formato de crescente ou côncavo, acompanhando a superfície cerebral.
Hemorragia Subaracnóidea (HSA) Traumática: Sangue no espaço subaracnóideo, visível nos sulcos e cisternas. É o tipo mais comum de sangramento traumático.
Contusões Cerebrais e Hematomas Intraparenquimatosos: Áreas de hemorragia dentro do parênquima cerebral.
Edema Cerebral: Caracterizado pelo apagamento dos sulcos corticais e compressão dos ventrículos.
Sinais de Herniação Cerebral: Desvio de estruturas da linha média, compressão de cisternas da base e obliteração ventricular.
Pérola Clínica: A ausência de alterações na TC inicial não exclui a possibilidade de uma lesão grave, como a Lesão Axonal Difusa (LAD) ou o desenvolvimento tardio de um hematoma. Pacientes com mecanismo de trauma significativo ou comorbidades (especialmente anticoagulados) devem ser observados clinicamente mesmo com uma TC normal.
Após a estabilização primária e o diagnóstico por imagem, o foco do tratamento se volta para a otimização das condições fisiológicas do paciente para prevenir a lesão cerebral secundária e manejar a pressão intracraniana (PIC).
Medidas Gerais
Estas medidas devem ser implementadas em todos os pacientes com TCE moderado a grave:
Posicionamento: Manter a cabeceira do leito elevada a 30 graus com a cabeça em posição neutra (alinhada com o corpo). Esta posição facilita a drenagem venosa cerebral, ajudando a reduzir a PIC, sem comprometer significativamente a pressão de perfusão cerebral.
Controle Térmico: Manter a normotermia (temperatura entre 36,0°C e 37,5°C). A febre aumenta o metabolismo cerebral e pode piorar o desfecho, devendo ser tratada agressivamente com antitérmicos e medidas físicas.
Controle Glicêmico: Manter a normoglicemia. Tanto a hiperglicemia quanto a hipoglicemia são deletérias para o cérebro lesionado. O alvo glicêmico geralmente fica entre 140-180 mg/dL na fase aguda.
Estabilidade Hemodinâmica: Manter a euvolemia e evitar a hipotensão a todo custo (objetivo: PAS ≥ 100 mmHg).
Manejo da Pressão Intracraniana (PIC)
Em pacientes com TCE grave ou com evidência de hipertensão intracraniana (HIC) na TC, medidas específicas para controlar a PIC são necessárias. A PIC normal é < 22 mmHg.
Sedoanalgesia: A dor e a agitação aumentam a PIC. A sedação (ex: Propofol) e a analgesia (ex: Fentanil) são fundamentais para manter o paciente confortável, adaptado à ventilação mecânica e com a PIC controlada.
Terapia Osmótica: Utilizada para reduzir o edema cerebral e, consequentemente, a PIC.
Manitol 20%: É um diurético osmótico que retira fluido do parênquima cerebral para o espaço intravascular. Dose: 0,25 a 1 g/kg em bolus, infundido em 20-30 minutos. Requer monitoramento da osmolaridade sérica e da função renal.
Solução Salina Hipertônica (SSH): Soluções com concentração de 3% a 23,4% também criam um gradiente osmótico, reduzindo o edema. Apresenta a vantagem de não causar diurese e pode ser benéfica em pacientes hipotensos.
Pérola Clínica: A hiperventilação (reduzir a PaCO₂) foi uma prática comum no passado, mas hoje é usada com cautela. A hipocapnia causa vasoconstrição cerebral, que de fato reduz a PIC, mas também pode diminuir o fluxo sanguíneo cerebral a níveis isquêmicos. Seu uso é restrito como medida de resgate temporária em casos de herniação cerebral iminente, enquanto se prepara para um tratamento definitivo.
Profilaxia de Convulsões
Convulsões precoces (que ocorrem na primeira semana após o TCE) podem aumentar o metabolismo cerebral e a PIC. A profilaxia é indicada em pacientes de alto risco.
Indicações: TCE grave (ECG ≤ 8), contusão cortical, fratura de crânio com afundamento, hematoma subdural ou epidural, e ferimento por projétil de arma de fogo.
Medicação: A Fenitoína é o anticonvulsivante classicamente utilizado, com uma dose de ataque seguida de manutenção por 7 dias. Levetiracetam é uma alternativa com menos interações medicamentosas.
Reversão de Anticoagulação
Pacientes em uso de anticoagulantes (ex: Varfarina) ou antiagregantes (ex: Clopidogrel) que sofrem um TCE têm alto risco de expansão de hematomas intracranianos. A reversão deve ser realizada o mais rápido possível em consulta com a equipe de hematologia, se disponível.
Varfarina: Reversão com Vitamina K e Complexo Protrombínico (preferencial) ou Plasma Fresco Congelado.
Novos Anticoagulantes (DOACs): Reversão com agentes específicos (ex: Idarucizumabe para Dabigatrana; Andexanet Alfa para inibidores do fator Xa) ou Complexo Protrombínico.
A identificação precoce de complicações agudas e a definição do local apropriado para o tratamento são etapas críticas no manejo do TCE. A decisão de transferir um paciente para um centro de maior complexidade pode salvar vidas.
Complicações Imediatas: Síndromes de Herniação Cerebral
A herniação cerebral ocorre quando o aumento da pressão intracraniana empurra o tecido cerebral de um compartimento para outro através de aberturas rígidas da dura-máter (ex: foice do cérebro, tentório do cerebelo). É uma emergência neurológica extrema.
Herniação Uncal (Transtentorial Lateral): A porção medial do lobo temporal (o uncus) hernia-se através da incisura tentorial. A manifestação clássica é a compressão do nervo oculomotor (III par), causando midríase paralítica ipsilateral à lesão, seguida de compressão do pedúnculo cerebral, levando a hemiparesia contralateral.
Herniação Central: Deslocamento descendente de ambos os hemisférios cerebrais e do diencéfalo. Causa miose pupilar bilateral inicial, seguida de midríase, e posturas motoras anormais (decorticação e depois descerebração).
Pérola Clínica: A "Tríade de Cushing" (hipertensão arterial, bradicardia e alteração do ritmo respiratório) é um sinal tardio e ominoso de hipertensão intracraniana grave e herniação cerebral iminente. Sua presença indica necessidade de intervenção imediata para redução da PIC.
Indicações para Consulta Neurocirúrgica Imediata
A avaliação por um neurocirurgião é urgente na presença de lesões com potencial de compressão ou efeito de massa. As indicações incluem:
Hematoma epidural ou subdural com espessura significativa (ex: >10 mm) ou que cause desvio da linha média (ex: >5 mm).
Qualquer hematoma em fossa posterior com efeito de massa sobre o IV ventrículo.
Fraturas de crânio com afundamento ou abertas.
Deterioração neurológica progressiva (ex: queda na pontuação da ECG).
Lesão por projétil de arma de fogo.
Critérios de Admissão e Transferência
A decisão sobre o destino do paciente (alta, observação, internação em enfermaria, UTI ou transferência) depende da gravidade do TCE, dos achados de imagem e dos recursos disponíveis no hospital.
Critérios de Admissão para Observação ou UTI:
UTI: Todos os pacientes com TCE grave (ECG ≤ 8) e muitos com TCE moderado (ECG 9-12), especialmente aqueles com alterações na TC ou que necessitam de monitoramento invasivo (PIC, ventilação mecânica).
Observação em Enfermaria/Unidade de Internação: Pacientes com TCE leve (ECG 13-15) que apresentam alterações na TC (ex: pequena contusão, HSA traumática mínima) mas estão neurologicamente estáveis, ou aqueles com TC normal mas com fatores de risco (ex: uso de anticoagulantes, convulsão pós-traumática).
Critérios de Transferência para um Centro de Trauma Especializado: No contexto do Sistema Único de Saúde (SUS), a regulação de vagas e a transferência para centros com maior capacidade de suporte são fundamentais. A transferência deve ser considerada quando o hospital de origem não possui os recursos necessários para o manejo adequado do paciente. Os principais critérios são: A transferência deve ser realizada somente após a estabilização hemodinâmica e respiratória do paciente, com via aérea segura e em contato direto entre as equipes médicas (médico-a-médico) para garantir a continuidade do cuidado.
Necessidade de avaliação neurocirúrgica e o hospital não dispõe de neurocirurgião de plantão.
Presença de lesão na TC que requer abordagem cirúrgica.
Necessidade de monitoramento da pressão intracraniana (PIC).
Deterioração neurológica apesar das medidas iniciais.
Necessidade de cuidados intensivos especializados que não estão disponíveis.

