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Introdução & Epidemiologia

O câncer de ovário representa uma das neoplasias ginecológicas mais letais, sendo um tópico de alta relevância para as provas de residência. Sua alta taxa de mortalidade está diretamente relacionada ao diagnóstico tardio, uma vez que os sintomas iniciais são inespecíficos e frequentemente negligenciados. Compreender sua classificação, epidemiologia e os fatores que contribuem para seu prognóstico sombrio é fundamental.

Definição e Classificação Histológica

O câncer de ovário é um termo que abrange um grupo heterogêneo de neoplasias malignas que se originam nos diferentes tipos celulares do ovário. A classificação histológica é a base para o prognóstico e a definição do tratamento. Os tumores são divididos em três categorias principais, com base em sua célula de origem:

  1. Tumores Epiteliais (85-90% dos casos): Originam-se do epitélio celômico que recobre a superfície ovariana ou de inclusões deste epitélio no estroma. São os mais comuns em mulheres adultas e idosas e responsáveis pela vasta maioria das mortes por câncer de ovário.
    • Seroso de Alto Grau (70-80% dos tumores epiteliais): O tipo mais comum e agressivo. Atualmente, acredita-se que a maioria se origine nas fímbrias da tuba uterina (origem tubária). Frequentemente associado a mutações nos genes BRCA1 e BRCA2.
    • Endometrioide (10%): Frequentemente associado à endometriose e, em alguns casos, a um carcinoma de endométrio coexistente. Geralmente tem um prognóstico melhor que o seroso.
    • Células Claras (10%): Também associado à endometriose. Conhecido por ser mais resistente à quimioterapia convencional.
    • Mucinoso (3-4%): Grandes tumores, muitas vezes multiloculados. É crucial diferenciá-los de metástases de tumores mucinosos do trato gastrointestinal (tumor de Krukenberg).
    • Seroso de Baixo Grau: Menos comum, cresce lentamente e é menos responsivo à quimioterapia, mas tem um prognóstico melhor em estágios iniciais.
  2. Tumores de Células Germinativas (5-10% dos casos): Originam-se das células germinativas primordiais do ovário. São mais comuns em mulheres jovens e adolescentes. Geralmente têm um excelente prognóstico devido à alta sensibilidade à quimioterapia.
    • Disgerminoma: O mais comum dos tumores germinativos malignos. É o análogo ovariano do seminoma testicular.
    • Tumor do Seio Endodérmico (Yolk Sac Tumor): Caracteriza-se pela produção de alfa-fetoproteína (AFP).
    • Coriocarcinoma: Produz gonadotrofina coriônica humana (hCG).
    • Teratoma Imaturo: Contém tecidos de todas as três camadas germinativas em um estado imaturo e caótico.
  3. Tumores do Cordão Sexual-Estromal (5-8% dos casos): Originam-se do estroma ovariano e dos cordões sexuais. Podem ser hormonalmente ativos, produzindo estrogênios ou androgênios.
    • Tumor de Células da Granulosa: O mais comum deste grupo. Tipicamente produz estrogênio, podendo causar puberdade precoce em meninas ou sangramento pós-menopausa em mulheres mais velhas. Caracteriza-se pela produção de inibina.
    • Sertoli-Leydig: Raro, pode produzir androgênios, levando a sinais de virilização (hirsutismo, clitoromegalia, engrossamento da voz).

Epidemiologia e Impacto Clínico

O câncer de ovário é a segunda neoplasia ginecológica mais comum no Brasil, mas é a mais letal. A alta taxa de letalidade (relação mortalidade/incidência) é o ponto central de sua importância clínica e para as provas.

  • Incidência: O pico de incidência dos tumores epiteliais ocorre na sexta e sétima décadas de vida (pós-menopausa).
  • Mortalidade: A principal razão para a alta mortalidade é o diagnóstico em estágios avançados (III e IV). Cerca de 75% das mulheres são diagnosticadas quando a doença já se disseminou pela cavidade peritoneal.
  • Diagnóstico Tardio: A ausência de sintomas específicos nos estágios iniciais e a falta de um método de rastreamento eficaz para a população geral contribuem para o diagnóstico tardio. Os sintomas, quando presentes, são vagos e frequentemente atribuídos a condições gastrointestinais ou urológicas benignas.

Raciocínio Clínico

Por que o câncer de ovário é chamado de "assassino silencioso"? Porque o ovário está localizado profundamente na pelve, permitindo que o tumor cresça significativamente e se dissemine pela cavidade peritoneal (carcinomatose peritoneal) antes de causar sintomas compressivos ou sistêmicos notáveis. Quando sintomas como ascite, distensão abdominal e saciedade precoce aparecem, a doença já está, na maioria das vezes, em estágio avançado.

Fisiopatologia

A compreensão da carcinogênese ovariana evoluiu significativamente. As teorias clássicas foram complementadas por modelos moleculares e genéticos que explicam melhor os diferentes subtipos histológicos e suas origens.

Teorias da Carcinogênese

  • Teoria da Ovulação Incessante: Proposta por Fathalla em 1971, esta teoria sugere que o trauma repetitivo e a reparação do epitélio superficial do ovário durante cada ciclo ovulatório aumentam a probabilidade de transformação maligna. Fatores que diminuem o número de ovulações ao longo da vida (gravidez, amamentação, uso de contraceptivos orais) são protetores, o que suporta esta hipótese.
  • Teoria da Origem Tubária (Modelo Dualístico): A teoria mais moderna, especialmente para o carcinoma seroso de alto grau (CSAG), postula que a maioria desses tumores não se origina no ovário, mas sim nas fímbrias da tuba uterina. Lesões precursoras, conhecidas como serous tubal intraepithelial carcinoma (STIC), são identificadas nas trompas de Falópio de mulheres com mutações BRCA submetidas a cirurgias de redução de risco. Essas células malignas se desprenderiam e se implantariam no ovário, que serve como um "solo fértil" para o crescimento tumoral.

Fatores Genéticos e Hereditários

Cerca de 20-25% dos cânceres de ovário epiteliais têm uma base hereditária. A identificação de síndromes genéticas é crucial para o aconselhamento, rastreamento e tratamento (terapias-alvo).

  • Mutações nos Genes BRCA1 e BRCA2: São as mais importantes. Associadas à Síndrome de Câncer de Mama e Ovário Hereditário (HBOC).
    • BRCA1: Aumenta o risco de câncer de ovário ao longo da vida para 40-60%.
    • BRCA2: Aumenta o risco de câncer de ovário ao longo da vida para 15-25%.
    • Essas mutações estão mais associadas ao subtipo seroso de alto grau.
  • Síndrome de Lynch (Câncer Colorretal Hereditário Não Poliposo - HNPCC): Causada por mutações em genes de reparo do DNA (mismatch repair), como MLH1, MSH2, MSH6 e PMS2. Aumenta o risco de câncer de cólon, endométrio, ovário (subtipos endometrioide e células claras) e outros tumores. O risco de câncer de ovário ao longo da vida é de cerca de 10-12%.

Fatores de Risco e Fatores Protetores

Conhecer os fatores de risco e proteção é um tema recorrente em provas. Eles estão, em sua maioria, ligados à teoria da ovulação incessante.

Fatores de Risco Fatores Protetores
  • Idade avançada (pós-menopausa)
  • História familiar de câncer de ovário, mama, cólon ou endométrio
  • Mutações genéticas (BRCA1/2, Síndrome de Lynch)
  • Nuliparidade (não ter tido filhos)
  • Menarca precoce e menopausa tardia (maior número de ciclos ovulatórios)
  • Infertilidade
  • Endometriose (associada aos tipos endometrioide e células claras)
  • Terapia de reposição hormonal (TRH) apenas com estrogênio
  • Tabagismo (associado ao tipo mucinoso)
  • Multiparidade (várias gestações)
  • Uso de contraceptivos orais combinados (redução de 50% do risco com uso >5 anos)
  • Amamentação
  • Laqueadura tubária
  • Salpingectomia (remoção das trompas)
  • Histerectomia

Armadilhas do ENARE: Nuliparidade vs. Infertilidade

Conceito-Chave Validado pelo Exame (ENARE 2023): É comum que os candidatos confundam os conceitos de nuliparidade e infertilidade. Ambos são fatores de risco, mas por razões potencialmente distintas. A nuliparidade aumenta o risco devido ao maior número de ciclos ovulatórios ("ovulação incessante"). A infertilidade, por sua vez, é um fator de risco independente, mesmo em mulheres nulíparas. A questão do ENARE 2023 exigia o reconhecimento de que a infertilidade em mulheres nulíparas aumenta o risco. A razão para isso pode estar ligada a disfunções ovulatórias subjacentes ou a condições associadas, como a endometriose, que por si só é um fator de risco para certos subtipos de câncer de ovário.

Apresentação Clínica & Exame Físico

A natureza insidiosa do câncer de ovário é sua característica clínica mais marcante. Os sintomas, quando surgem, são vagos, persistentes e progressivos, mas facilmente confundidos com outras condições mais comuns.

Sintomas Comuns

Os sintomas são frequentemente descritos como um "complexo sintomático" e incluem:

  • Distensão abdominal ou inchaço (bloating): O sintoma mais comum, geralmente devido ao crescimento do tumor ou ao acúmulo de líquido ascítico.
  • Dor pélvica ou abdominal: Pode ser uma dor surda, constante ou intermitente.
  • Dificuldade para se alimentar ou sensação de plenitude precoce (saciedade precoce): Causada pela compressão do estômago e intestinos pela massa tumoral ou pela ascite.
  • Sintomas urinários: Urgência ou frequência urinária aumentadas devido à compressão da bexiga.

Outros sintomas menos comuns incluem alteração do hábito intestinal (constipação ou diarreia), dor lombar, dispareunia e perda de peso inexplicada. A presença desses sintomas de forma persistente e com início recente (especialmente em mulheres na perimenopausa ou pós-menopausa) deve levantar alta suspeita.

Exame Físico

O exame físico pode ser normal nos estágios iniciais. Em estágios mais avançados, os achados podem ser mais evidentes:

  • Exame Abdominal:
    • Massa abdominal ou pélvica palpável.
    • Ascite, detectável pelo sinal do macicez móvel ou pelo piparote.
    • Nódulo de Sister Mary Joseph: Um nódulo umbilical metastático, sinal de doença avançada.
  • Exame Pélvico (Toque Bimanual e Exame Especular):
    • Massa anexial, que pode ser fixa, irregular, sólida ou nodular.
    • Fundo de saco de Douglas nodular ou endurecido (prateleira de Blumer): Sugere implantes peritoneais.
  • Exame Geral:
    • Sinais de derrame pleural (macicez à percussão, murmúrio vesicular diminuído na base pulmonar), que caracteriza a doença em estágio IV.
    • Linfonodomegalia supraclavicular (nódulo de Virchow) ou inguinal.
    • Sinais de emagrecimento e caquexia.

Avaliação Diagnóstica

A abordagem diagnóstica de uma massa anexial suspeita visa diferenciar lesões benignas de malignas, estadiar a doença se a malignidade for provável e planejar a abordagem cirúrgica. O diagnóstico definitivo é sempre histopatológico.

Passos da Avaliação

  1. Exame Pélvico: O primeiro passo na avaliação de qualquer queixa ginecológica. Caracteriza a massa quanto ao tamanho, mobilidade, consistência e localização.
  2. Ultrassonografia Transvaginal (USTV): É o método de imagem de escolha para caracterizar uma massa anexial. É mais sensível que a ultrassonografia abdominal para detalhes ovarianos.

    Características Ultrassonográficas de Suspeita de Malignidade:

    • Componentes sólidos ou excrescências papilares.
    • Septos espessos (>2-3 mm).
    • Irregularidade da parede do cisto.
    • Tamanho grande (>5-10 cm).
    • Presença de ascite.
    • Aumento da vascularização ao Doppler colorido (baixo índice de resistência).
  3. Marcadores Tumorais Séricos:
    • CA-125: O marcador mais importante para tumores epiteliais. Não é um teste de rastreamento. Sua principal utilidade é na avaliação de uma massa pélvica em mulheres na pós-menopausa e no monitoramento da resposta ao tratamento e detecção de recorrência.

      Armadilhas do ENARE

      O CA-125 tem baixa especificidade, especialmente em mulheres na pré-menopausa. Pode estar elevado em diversas condições benignas, como endometriose, miomas, doença inflamatória pélvica, cirrose, pancreatite e até mesmo na gravidez e menstruação. Por outro lado, pode estar normal em até 50% dos casos de câncer de ovário em estágio inicial.

    • Outros Marcadores (para tumores não epiteliais): Em mulheres jovens com massa anexial, outros marcadores são essenciais:
      • AFP (Alfa-fetoproteína): Elevada no tumor do seio endodérmico.
      • hCG (Gonadotrofina Coriônica Humana): Elevado no coriocarcinoma e, às vezes, no disgerminoma.
      • LDH (Desidrogenase Lática): Frequentemente elevado no disgerminoma.
      • Inibina A e B: Elevada nos tumores de células da granulosa.
  4. Índices de Risco de Malignidade (RMI - Risk of Malignancy Index): Combinam achados da ultrassonografia, status da menopausa e níveis de CA-125 para estratificar o risco de uma massa anexial ser maligna. O RMI é frequentemente usado para decidir se a paciente deve ser encaminhada a um centro oncológico especializado.
  5. Tomografia Computadorizada (TC) de Abdome e Pelve com Contraste: Não é usada para o diagnóstico inicial da massa, mas é fundamental para o estadiamento pré-operatório. Avalia a extensão da doença na cavidade abdominal e pélvica (carcinomatose peritoneal, metástases hepáticas, linfonodomegalia retroperitoneal) e no tórax (derrame pleural, metástases pulmonares).

O diagnóstico definitivo é obtido através da análise histopatológica do tumor, geralmente removido durante a cirurgia. A biópsia percutânea de uma massa ovariana é geralmente contraindicada pelo risco de romper a cápsula do tumor e disseminar células malignas na cavidade peritoneal, piorando o estadiamento e o prognóstico.

Tratamento e Manejo

O tratamento do câncer de ovário é multimodal, mas a cirurgia é a pedra angular, seguida, na maioria dos casos, por quimioterapia. O objetivo é duplo: estadiar a doença com precisão e remover a maior quantidade possível de tumor visível.

Tratamento Cirúrgico

A cirurgia deve ser realizada por um ginecologista oncológico. Consiste em duas partes principais: estadiamento cirúrgico e citorredução (debulking).

Estadiamento Cirúrgico Completo:

Procedimento padronizado para determinar a extensão da doença. Mesmo que o tumor pareça confinado ao ovário, o estadiamento completo é obrigatório.

  1. Laparotomia exploradora mediana.
  2. Coleta de lavado peritoneal ou ascite para análise citológica.
  3. Inspeção e palpação de toda a cavidade abdominal e pélvica.
  4. Histerectomia total abdominal com salpingo-ooforectomia bilateral (HTA + SOB).
  5. Omentectomia infracólica.
  6. Biópsias peritoneais múltiplas (fundo de saco, goteiras parietocólicas, cúpulas diafragmáticas).
  7. Linfadenectomia pélvica e para-aórtica.

Cirurgia Citorredutora (Debulking):

Em casos de doença avançada, o objetivo é a citorredução máxima, que significa remover todo o tumor macroscopicamente visível. O sucesso desta cirurgia é o fator prognóstico mais importante que pode ser modificado pelo tratamento.

  • Citorredução Ótima: Definida como a presença de doença residual com o maior implante medindo < 1 cm de diâmetro.
  • Citorredução Completa (R0): Ausência de doença residual visível. Este é o objetivo principal e está associado à melhor sobrevida.

Quimioterapia

A quimioterapia é o pilar do tratamento adjuvante (após a cirurgia) para a maioria dos cânceres de ovário epiteliais, a partir do estágio IC.

  • Esquema Padrão: A combinação de um agente de platina com um taxano é o padrão ouro. O regime mais comum é Carboplatina e Paclitaxel, administrado por via intravenosa a cada 3 semanas, por 6 ciclos.
  • Quimioterapia Neoadjuvante: Em pacientes com doença muito avançada ou com comorbidades que as tornam más candidatas à cirurgia citorredutora primária, pode-se optar por iniciar com 3 ciclos de quimioterapia, seguida pela cirurgia (cirurgia de intervalo) e, depois, mais 3 ciclos de quimioterapia.

Terapias-Alvo

Avanços recentes na biologia molecular levaram ao desenvolvimento de terapias-alvo que melhoraram significativamente o prognóstico, especialmente no tratamento de manutenção e na doença recorrente.

  • Inibidores da PARP (Poli ADP-ribose polimerase):
    • Mecanismo de Ação: Em células com mutação BRCA, há um defeito no reparo de DNA por recombinação homóloga. A PARP é uma enzima envolvida em outra via de reparo. O bloqueio da PARP em uma célula com mutação BRCA leva à "letalidade sintética", causando a morte da célula tumoral.
    • Indicação: Principalmente como terapia de manutenção em pacientes (com ou sem mutação BRCA) que responderam à quimioterapia à base de platina. Exemplos: Olaparibe, Niraparibe.
  • Agentes Anti-angiogênicos:
    • Mecanismo de Ação: Inibem a formação de novos vasos sanguíneos (angiogênese), que são essenciais para o crescimento do tumor.
    • Exemplo: O Bevacizumabe é um anticorpo monoclonal que se liga ao VEGF (fator de crescimento endotelial vascular). Pode ser adicionado à quimioterapia e continuado como manutenção.

Complicações e Prognóstico

Apesar dos avanços no tratamento, o câncer de ovário continua a ser uma doença desafiadora, com altas taxas de recorrência e complicações significativas relacionadas ao tratamento.

Complicações

  • Cirúrgicas: A citorredução é uma cirurgia extensa e agressiva. As complicações incluem lesão intestinal (requerendo ressecção e/ou colostomia), lesão de bexiga ou ureter, hemorragia, infecção e tromboembolismo.
  • Relacionadas à Quimioterapia:
    • Toxicidade Hematológica: Neutropenia (risco de neutropenia febril), anemia, trombocitopenia.
    • Neurotoxicidade: Neuropatia periférica induzida pelo paclitaxel (dormência, formigamento nas mãos e pés).
    • Nefrotoxicidade e Ototoxicidade: Associadas a compostos de platina (mais com cisplatina do que com carboplatina).
    • Outras: Náuseas, vômitos, alopecia, fadiga, mucosite.

Recorrência

A recorrência é a regra, e não a exceção, para a doença em estágio avançado. O manejo da doença recorrente depende do intervalo livre de platina (ILP), o tempo desde a última dose de quimioterapia à base de platina até a detecção da recorrência.

  • Doença Platino-Sensível (ILP > 6 meses): A doença é considerada sensível à platina. O tratamento geralmente envolve a reintrodução de um esquema à base de platina.
  • Doença Platino-Resistente (ILP < 6 meses): A doença progrediu durante ou logo após a terapia com platina. O prognóstico é pior, e o tratamento envolve agentes quimioterápicos de agente único não-platínicos.

Prognóstico

O prognóstico depende fortemente de três fatores principais:

  1. Estágio no diagnóstico: O fator mais importante.
  2. Resultado da cirurgia citorredutora: A ausência de doença residual (R0) é o objetivo.
  3. Subtipo histológico e grau do tumor.
Taxa de Sobrevida em 5 Anos por Estágio (FIGO) para Câncer de Ovário Epitelial
Estágio Descrição Resumida Sobrevida em 5 Anos
Estágio I Tumor confinado aos ovários ~90%
Estágio II Extensão para outros tecidos pélvicos ~70%
Estágio III Implantes peritoneais fora da pelve e/ou metástases em linfonodos retroperitoneais ~40%
Estágio IV Metástases a distância (ex: derrame pleural maligno, metástases parenquimatosas no fígado/baço) ~20%

Populações Especiais

O manejo do câncer de ovário requer considerações especiais em certos grupos de pacientes, como mulheres jovens que desejam preservar a fertilidade e aquelas com alto risco genético.

Tumores de Células Germinativas em Mulheres Jovens

Esses tumores afetam predominantemente mulheres com menos de 30 anos. Ao contrário dos tumores epiteliais, eles têm um excelente prognóstico.

  • Cirurgia de Preservação da Fertilidade: O tratamento padrão para a doença em estágio inicial é a salpingo-ooforectomia unilateral (remoção do ovário e trompa afetados), preservando o útero e o ovário contralateral. O estadiamento cirúrgico completo (com exceção da remoção do outro ovário e útero) ainda é necessário.
  • Quimioterapia: Esses tumores são extremamente quimiossensíveis. O esquema padrão é o BEP (Bleomicina, Etoposídeo e Cisplatina). A maioria das pacientes consegue retomar a menstruação e engravidar após o tratamento.

Rastreamento e Prevenção em Populações de Alto Risco

Este é um ponto crucial e frequentemente testado em exames.

Raciocínio Clínico: Rastreamento na População Geral vs. Alto Risco

Não existe método de rastreamento eficaz para o câncer de ovário na população de risco habitual. Estudos em larga escala mostraram que o rastreamento com CA-125 e/ou ultrassonografia transvaginal não reduz a mortalidade e leva a um grande número de cirurgias desnecessárias (falso-positivos). Portanto, o rastreamento não é recomendado para a população geral.

Para mulheres com alto risco genético (ex: portadoras de mutação BRCA1/2), a abordagem é diferente:

  • Vigilância (Rastreamento): A partir dos 30-35 anos (ou 5-10 anos antes do caso mais precoce na família), recomenda-se a realização de ultrassonografia transvaginal e dosagem de CA-125 a cada 6 meses. É importante ressaltar que a eficácia desta vigilância em reduzir a mortalidade é incerta e controversa.
  • Cirurgia de Redução de Risco (CRR): A medida mais eficaz para prevenir o câncer de ovário nesta população. Recomenda-se a salpingo-ooforectomia bilateral redutora de risco (SOBRR).
    • Quando realizar: Geralmente entre 35-40 anos para portadoras de BRCA1 e 40-45 anos para portadoras de BRCA2, ou após a prole estar completa.
    • Eficácia: Reduz o risco de câncer de ovário/trompa em 80-96% e o risco de câncer de mama em cerca de 50%.
  • Quimioprevenção: O uso de contraceptivos orais combinados é uma opção para reduzir o risco em portadoras de mutação que ainda não realizaram a CRR.
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